"Casar virou namorar, namorar
virou ficar, ficar virou provar.
Acredito que todo mundo casa
fácil porque é também muito fácil se separar.
Nos anos 70, o casamento era
medido por décadas. Mesmo quando um casamento fracassava, durava no mínimo duas
décadas.
Nos anos 80, o casamento era
medido por anos. Mesmo quando um casamento desmoronava, durava no mínimo cinco
anos.
O casamento hoje é por dia. Como
se fosse hotel.
Agora, o matrimônio cobra diária.
Todo dia é dia de se separar. E por qualquer coisa.
Las Vegas do divórcio é aqui.
Você pode sair de manhã, eufórico
e confiante, extremamente disposto, seguro do romance, e quando voltar à noite
não encontrar mais ninguém ao seu lado.
Se cometeu uma falha, nem terá
oportunidade de se explicar. Se não errou, nem terá chance de entender e
desfazer confusões.
É tão simples se divorciar que
ninguém mais pretende se estressar. Não há nem o civilizado e educado aviso de
despejo. É dar as costas, largar o passado e seguir adiante. Quebrou o amor,
troca! Quebrou o amor, compra outro! Quebrou o amor, não vale investir
consertando!
Os casais não brigam mais até
cansar para, então, se separar. Não brigam mais até esgotar as possibilidades
para, então, se separar. Não tentam durante semanas e semanas expor as dores,
as feridas e a raiva para, então, se separar. Não recorrem ao choro, à
histeria, ao perdão, ao abraço, ao exorcismo, aos centros religiosos, aos
amigos, aos parentes para, então, se separar.
A separação vem antes. A
separação é a regra. A separação é o hábito. A separação é seca, definitiva,
sem explicações.
As pessoas se separam primeiro
para depois discutir. As pessoas se separam primeiro para depois conversar. As
pessoas se separam primeiro para depois desabafar o que incomoda.
Elas arrumam todas as malas,
esvaziam os armários, realizam a limpa no apartamento e depois, se houver
vontade, se encontram e sentam frente a frente para resolver as diferenças.
São uniões interrompidas com
silenciadores, distante de estampidos e gritos.
Ninguém se separa de fato, todo
mundo deserta, todo mundo abandona a convivência.
É uma irresponsabilidade
extraordinária com o outro, é uma indiferença tremenda ao que foi construído
com o outro, é um desprezo ao que foi sonhado a dois.
E os motivos podem ser os mais
loucos e insignificantes. O desenlace não ocorre mais por justificativas duras
como adultério e deslealdade.
Há gente que se separa por
incompatibilidade de gênios (expressão que denuncia megalomania, o correto
seria incompatibilidade de burros).
Há gente que se separa porque não
suporta o medo de ser traído.
Há gente que se separa porque
estava muito feliz e não aguentava tamanha pressão.
Há gente que se separa porque se
viu entregue ao relacionamento e estava perdendo a identidade.
Há gente que se separa porque não
sabia mais o que estava fazendo da vida.
Há gente que se separa porque não
esperava que fosse assim.
Atualmente entra-se numa relação
e não se fecha a porta – a porta permanece encostada o tempo inteiro."
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