Não
dá para eu falar apenas de flores, mas posso aqui falar de minha emoção.
Emoção que me invadiu desde
o mês passado ao ver os jovens de novo nas ruas, jovens que chamaram o povo
para ir ás ruas falar de sua indignação.
Há muitas análises sobre o
que está acontecendo, que coloca para todos nós, sairmos de nossa acomodação de
pensamento e refletir.
Refletir
sobre a força das redes sociais e como se pode usá-las, não apenas para conversas
sem sentido, sem contato. Elas também podem gerar emoção... que transborde, que
inflame, que motive, que faça com que cada um saia do seu lugar.
Lembrei
de uma música ao ver as manifestações e trago ela em um vídeo que achei.
Ninguém
que foi ás ruas em algum momento, sai o mesmo.Todos podem sentir o que se
acontece de fato.
E
os que não foram as ruas, que possam ir buscar na internet o que a mídia televisiva não mostrou, o que ela
esconde, o que distorce.
Que
aqueles que buscam respostas e não se contentam com o que a TV mostra, busquem
imagens na internet postadas por diversos anônimos e se ponham a refletir: sobre
a violência, sobre o que é de fato violência, sobre que país queremos, sobre
que políticos queremos, sobre que democracia queremos, sobre que ética estamos
vivendo, sobre que valores temos em nosso dia a dia, sobre o que queremos para
nossa vida e o que estas manifestações tem a ver conosco, participantes ou não
delas.
As
manifestações em nosso país, me levaram a Wilhelm Reich, psicanalista do século
XIX, que foi e é uma das minhas mais
belas orientações ao meu trabalho.Em “Escuta, Zé Ninguém” um de
seus livros dirigidos a todos nós, homens e mulheres comuns que buscam a
felicidade, Reich dialoga com aqueles
que sem perceber delegam a outros sua vida, que sem perceber trazem a repressão
incrustada em seu corpo, em sua mente, em sua emoção.
Trago alguns trechos do
livro para nos ajudar a refletir, sobre como participamos de tudo isso que está
acontecendo em nosso país.
“ Você Zé Ninguém, onde quer que seja que tu consigas o poder político como representante do povo, em qualquer democracia por aí, assumes justamente o que sofrias, isto é, o comportamento sádico e sanguinário dos governantes e metes a mão no dinheiro alheio. Promovido a amo, tuas possibilidades de grandeza, simplicidade, coragem, definham. Lá, na Casa do Povo, não crias as leis que protegem a vida humana. Ou neste outro tipo: Por mais enraizado teu hábito de elogiar os fortes e poderosos, lembra que a exploração do teu trabalho por eles é mais grave do que há 300 anos. O desdém deles pela tua vida hoje é mais brutal, pois eles fazem agora desaparecer todo e qualquer reconhecimento dos teus direitos! E tu os admiras!...”
“Serias tu o
Zé Ninguém que não reclama os teus direitos sobre a tua vida? Não te sentes
merecedor do direito à felicidade neste mundo? Não assumes as responsabilidades
que te cabe para não te entregares aos teus tiranos? Aspiras quando muito a
procriar, a se tornar num grande homem medíocre, tão somente um homem rico não
pelo trabalho? Não fazes a mínima idéia do que seja a verdade, ou a História,
ou a luta pela liberdade? Eu te compreendo porque conheço a tua vida através da
minha própria existência passada.
Escuta, Zé Ninguém, em tempos idos cometemos a
covardia de trocar a liberdade pelos fascistas Hitler, Mussolini, Salazar,
Franco. Por quê? Temos medo de ser livres. Pobre Zé Ninguém, geraste no teu
próprio seio o funcionariozinho místico, sádico e impotente que te levou ao
Terceiro Reich e enterrou 60 milhões da tua espécie, enquanto gritavas: Viva!
Nós, Zé Ninguéns, louvamos os conquistadores sanguinários, chamamos de
terroristas os heróis que combatem as ditaduras, travam suas lutas contra as
doenças, a miséria, o sofrimento. Tu chamas de terroristas os torturados que
dão a vida por tua liberdade, por justiça a teu favor! Enforcamos os nazistas
depois de terem assassinado milhões, mas onde estávamos antes? Temos preferido
ser escravos de quem quer que seja. Nenhuma tirania poderia prevalecer contra
nós se tivéssemos ao menos uma sombra de respeito por nós próprios na nossa
vida quotidiana. Tu vives empolgado com o sangue derramado pelos hunos e atilas
de todas as nações, que nada mais são do que milhões de Zés Ninguéns como tu.
Devias pensar em servir à vida, não à morte. Devias deixar que marechais
e diplomatas se matem uns aos outros, pessoalmente...”
“Eu te exorto ao cumprimento das leis apenas quando
elas fazem sentido e a romper corajosamente com elas quando escondem armadilhas
leoninas. Não creias que para ser religioso seja necessário destruir tua vida
afetiva e encolher o corpo e o espírito. O homem precisa apenas ser um ser humano.
Mas tu és o povo, a opinião pública, a consciência social. Pensa na
responsabilidade gigantesca que esses atributos te conferem. Deves indagar se
pensas corretamente, quer do ponto de vista da trajetória social, onde estás
inserido, quer da parte da natureza dos atos humanos..”.
“Tu acreditas cegamente em tudo o que os jornais
escrevem! Não distingues o abismo de estupidez, mau gosto, mentiras e
manipulação dirigidas aos teus ouvidos pelos meios de comunicação! Engoles
bovinamente tudo o que te segredam aos ouvidos, ambos surdos à verdade e ao
amor!
“Perguntas-me se poderei dizer-te quando saberás
viver a tua vida em paz e segurança; a resposta consiste no inverso da tua
forma de ser atual: viverás bem e em paz quando a vida significar para ti mais
do que a segurança; o amor mais do que o dinheiro; a tua liberdade mais do que
as linhas diretivas do partido ou a opinião pública; quando a tua forma de
pensar estiver de acordo, e não, como hoje, em discordância, com a tua forma de
sentir; quando te for possível reconhecer os teus dotes a tempo e reconhecer
a tempo o teu declínio, a tua velhice; quando te for possível
viver o pensamento dos grandes homens em lugar dos crimes dos ditos grandes
guerreiros; quando os professores dos teus filhos forem mais bem pagos que os
políticos; quando tiveres maior respeito pelo amor entre um homem e uma mulher
do que por um certificado de casamento; quando puderes reconhecer os teus erros refletindo a tempo, e
não demasiado tarde, como o fazes hoje..”
Não precisamos
ter medo ... do medo. Somos todos parte desta história que está acontecendo,
querendo ou não. Podemos ser anônimos, mas não temos que ser um Zé ninguém.
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